A Síndrome de Li-Fraumeni (SLF) é uma síndrome hereditária de predisposição ao câncer que eleva o risco de desenvolver um grande espectro de tumores agressivos, alguns muito raros, em idade muito jovem. 

Quase metade dos indivíduos afetados pela SLF têm o primeiro diagnóstico de câncer antes dos 30 anos.

A SLF foi descrita por Frederick Li e Joseph Fraumeni, médicos norte-americanos, em 1969, através de observações de quatro famílias com alta incidência de sarcoma de tecidos moles em crianças. A avaliação constatou suscetibilidade aumentada ao câncer nestas famílias caracterizada pelo grande número de indivíduos afetados e alta ocorrência de múltiplos tumores primários em jovens. Esses tumores são chamados de tumores centrais ou core tumors, são eles:  

  • Osteossarcoma: tumor ósseo que geralmente acomete adolescentes. 
  • Sarcoma de partes moles: câncer raro que pode se desenvolver em várias partes do corpo, como músculos, tendões, tecido adiposo, linfa e vasos sanguíneos e acomete crianças e adultos, antes dos 45 anos.
  • Tumores cerebrais: Tais como gliomas, incluindo glioblastomas, são mais frequentes em adultos; carcinoma do plexo coróide, meduloblastoma e neuroblastoma, tumores raros que geralmente afetam crianças.
  • Carcinoma adrenocortical: tumor que se forma no córtex adrenal, camada externa das glândulas supra-renais.
  • Leucemia aguda: câncer sanguíneo.
  • Câncer de mama: frequente em mulheres, antes dos 35 anos.

Além disso, algumas famílias com a síndrome possuem outros tipos de tumores, como melanoma, colorretal, câncer de pulmão, estômago e de próstata, tumores de células germinativas e tumor de Wilms.

Critérios clínicos para a SLF

A suspeita clínica da Síndrome de Li-Fraumeni é baseada nos padrões de tumores observados no paciente e em seus familiares de primeiro e segundo graus.

Os critérios clássicos da SLF são baseados no espectro dos tumores centrais, sendo definidos por um indivíduo diagnosticado com sarcoma em idade jovem e dois familiares de primeiro e/ou segundo grau diagnosticado com osteosarcomas, sarcomas de partes moles, câncer de mama em mulheres na pré-menopausa, tumores do sistema nervoso central, carcinoma adrenocortical ou leucemias agudas.

Como o padrão de ocorrência de tumores em algumas famílias com a SLF não é inteiramente consistente com os critérios clássicos, os critérios sofreram algumas atualizações, incluindo critérios menos estritos e inserindo tumores como melanoma, colorretal, câncer de pulmão, estômago e de próstata. Assim a síndrome recebeu o nome de Síndrome de Li-Fraumeni-Like (LFL).

Causas da SLF

A SLF possui padrão de herança autossômica dominante e é causada por variantes germinativas patogênicas (P) ou provavelmente patogênicas (PP) no gene TP53

Cerca de 75% das famílias com Síndrome de Li-Fraumeni e 25% das famílias com Síndrome de Li-Fraumeni like possuem variantes germinativas no gene TP53. 

Heredograma representando o padrão de herança autossômico dominante

O gene TP53 codifica a proteína p53, um fator de transcrição conhecido como “guardião do genoma”, que desempenha funções-chave na manutenção da fidelidade da replicação e integridade do material genético, nos mecanismos de reparo do DNA, na apoptose e indução de parada do ciclo celular. A proteína é um dos principais genes supressores de tumor e quando alterada, predispõe ao aparecimento de tumores.

Síndrome de  Li-Fraumeni é uma das principais Síndromes Hereditárias que predispõem o câncer de mama. Enquanto que mulheres da população em geral possuem 0,4% de chance de desenvolver tumores antes dos 40 anos, a chance para portadoras da SLF sobe para 85%. 

Incidência da SLF

A Síndrome de Li-Fraumeni é rara, acometendo de 1 em 5.000 a 1 em 20.000 pessoas em todo o mundo. Contudo, no Sul e Sudeste do Brasil, a incidência da condição é muito maior, estimada em 1 a cada 300 pessoas.

Nessas regiões do Brasil a alta incidência da SLF é principalmente ocasionada pela variante fundadora R337H do gene TP53.  A variante R337H confere penetrância incompleta da Síndrome de Li-Fraumeni, uma vez que a predisposição ao desenvolvimento de câncer com esta variante é de 50- 60%, em comparação às outras variantes do gene que o risco atinge até 90% ao longo da vida. 

Estudo sobre câncer de mama hereditário no Brasil

Um estudo brasileiro sobre câncer de mama hereditário apontou a distribuição de variantes germinativas nos genes de predisposição ao câncer, trazendo destaque para a prevalência da variante R337H do gene TP53 nos pacientes oriundos principalmente das regiões Sul e Sudeste do Brasil.A pesquisa ainda ressaltou a importância do uso de painéis multigênicos para ampliar a identificação de variantes germinativas associadas ao câncer de mama hereditário, aumentando a precisão e agilidade nos diagnósticos.Leia mais sobre o estudo neste artigo.

Embora o desenvolvimento de tumores possa ocorrer em qualquer momento da vida de um indivíduo com SLF, portadores da variante R337H apresentam uma predisposição bimodal (dois picos) de desenvolvimento de câncer associada à idade ao diagnóstico.

O primeiro pico em que há alta predisposição de tumores em portadores da SLF ocorre na primeira década de vida, representado principalmente por tumores adrenocorticais, já o segundo pico na quinta década de vida, com ocorrência de diversos tipos de tumores, como câncer de mama, tumores gastrointestinais e de pulmão.

Gráfico mostrando a frequência de tumores e idade ao diagnóstico de pessoas portadoras da Síndrome de Li-Fraumeni

Vigilância e prevenção de tumores da SLF

A identificação de um indivíduo afetado por câncer hereditário é fundamental para a identificação dos familiares em risco, busca de aconselhamento genético apropriado e inclusão em programas de redução de risco do câncer. 

As diretrizes de rastreamento de câncer para portadores de variantes germinativas em TP53 são baseadas no Protocolo de Toronto e variam de acordo com a idade e tipo de tumor, podendo incluir ciclos trimestrais de exames, como: ressonância magnética de corpo inteiro, ressonância magnética cerebral, ultrassonografia abdominal e marcadores bioquímicos da função cortical adrenal. 

A história de Régis Feitosa Mota e a Síndrome de Li-Fraumeni

O economista Régis Feitosa Mota, portador de uma variante patogênica em TP53, perdeu seus três filhos para o câncer, segundo a BBC News Brasil, 

O primeiro diagnóstico de câncer na família de Régis foi de leucemia linfóide aguda em sua filha mais velha, Anna Carolina, na época com 12 anos de idade. Sete anos depois, Régis (46 anos) desenvolveu leucemia linfóide crônica e seu filho do meio, Pedro (então com 17 anos), osteossarcoma, no mesmo ano.

Os três diagnósticos em conjunto preenchem critérios para a Síndrome de Li-Fraumeni e a investigação molecular do gene TP53 confirmou o achado, em Régis e em seus três filhos.

Régis afirma que nenhum outro parente próximo dele ou as mães de seus filhos são portadores da síndrome. “Não sabemos a origem dessa minha alteração genética, até porque meus pais não têm. O meu pai atualmente tem 85 anos e a minha mãe tem 78. São saudáveis”.

A história familiar de Régis é compatível com uma mutação de novo em PT53, onde a variante germinativa ocorreu no início de seu desenvolvimento e posteriormente foi passada para seus descendentes.

Registros de mutação de novo em TP53 são frequentes e, dependendo da população, podem ocorrer em até 20% dos indivíduos. 

Em 2017, a filha mais nova de Régis, Beatriz, desenvolveu leucemia linfóide aguda com 9 anos de idade, e após a recidiva da doença, faleceu em 2018. Além disso, Pedro desenvolveu metástases decorrentes do osteossarcoma e, em 2018, um tumor cerebral, vindo a falecer em 2020, aos 22 anos.

Em meio ao luto de seus filhos, Régis foi diagnosticado com um linfoma não Hodgkin em 2021, mesmo ano em que Anna Carolina foi diagnosticada com um tumor cerebral aos 25 anos. Anna Carolina faleceu em novembro de 2022 e Régis segue o tratamento para seus tumores.

Síndrome de Li-Fraumeni e Mendelics

A Mendelics oferece testes genéticos de Painéis de Sequenciamento de Nova Geração (NGS) para a investigação de Síndromes de Câncer Hereditário, incluindo a Síndrome de Li-Fraumeni, que permitem um diagnóstico preciso e um melhor planejamento da conduta terapêutica.

Entre os exames genéticos está o Painel de câncer hereditário completo, que avalia 265 genes + CNVs (Variação no número de cópias), e também o MLPA para o  gene TP53

Os exames servem para diagnóstico (confirmar se a causa do câncer é hereditária) e para definir procedimentos e tratamentos preventivos, além de servir de alerta para a família do paciente, que deve seguir com medidas preventivas, como aconselhamento genético e acompanhamento médico regular. 

Todo exame genético de diagnóstico só é feito a partir de um pedido médico.

Caso queira saber mais sobre o painel ou outros exames genéticos, entre em contato com nosso atendimento através do telefone (11) 5096-6001 ou pelo e-mail contato@mendelics.com.br.

Revisão

O que é Síndrome de Li-Fraumeni?

A Síndrome de Li-Fraumeni (SLF) é uma síndrome hereditária de predisposição ao câncer que eleva o risco de desenvolver um grande espectro de tumores agressivos, alguns muito raros, em idade muito jovem. 

O que causa a Síndrome de Li-Fraumeni?

A SLF é causada por variantes germinativas patogênicas ou provavelmente patogênicas no gene TP53

Quais são os tumores centrais da Síndrome de Li-Fraumeni?

Os tumores centrais da Síndrome de Li-Fraumeni são osteossarcoma, sarcoma de partes moles, tumores cerebrais, carcinoma adrenocortical, leucemia aguda e câncer de mama.

Referências

4 respostas para “Síndrome de Li-Fraumeni: conheça a doença

  1. Avatar de Edson
    Edson

    Gostei muito da explicação foi bem detalhada, parabéns

    1. Avatar de Juliana Gomes
      Juliana Gomes

      Olá, Edson!
      Agradecemos seu comentário.
      Ficamos felizes em contribuir com o entendimento desse tópico.
      Continue acompanhando nosso blog!

  2. Avatar de Jani hellen Pacheco
    Jani hellen Pacheco

    Bem esclarecedor e explicativo.
    Sou portadora da Síndrome de Li-Fraumeni e é bem difícil achar informações sobre.

    1. Avatar de Nathália Taniguti
      Nathália Taniguti

      Olá, Jani Hellen!
      Agradecemos o seu comentário.
      Ficamos felizes em contribuir com o entendimento desse assunto.
      Continue acompanhando nosso blog!

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