Henrietta teve, sem seu conhecimento, células retiradas de seu corpo e que depois foram usadas em pesquisas. Conheça as obras que contam sua vida.
Henrietta Lacks foi uma mulher afro-americana, diagnosticada com câncer de colo de útero, em 1950, quando tinha pouco mais de 30 anos. Durante as consultas, médicos retiraram, sem ela saber, amostras das células de seu tumor que depois foram levadas a um laboratório.
De forma inesperada, as células retiradas de Henrietta se multiplicaram indefinidamente em condições in vitro, se tornando uma linhagem que ficou conhecida como células imortais ou células HeLa (He = de Henrietta e La = de Lacks).
As células HeLa foram e continuam sendo usadas em inúmeras pesquisas, essenciais para a conquista de grandes avanços na medicina, embora a família não soubesse de seu uso mesmo passado um longo período após a morte de Henrietta.
Conheça a história e as obras que abordam a vida de Henrietta Lacks, que perdeu a luta contra o câncer de forma precoce, sem saber que, após sua morte, ajudaria a salvar tantas vidas.
Quem foi Henrietta Lacks?
De origem simples, descendente de escravos e filha de uma família de plantadores de tabaco, Henrietta nasceu em Roanoke (VA) no ano de 1920, onde passou grande parte de sua infância e adolescência nos campos de fumo, enquanto ajudava sua família.
Depois do casamento, mudou-se para a cidade de Baltimore (MD), onde, com sua família, viveu em meio a um conturbado período de segregação racial.
Após meses sofrendo com fortes dores no abdômen e sangramentos, Henrietta decidiu ir ao Hospital Johns Hopkins onde recebeu o diagnóstico de câncer de colo de útero. O tipo de tumor que acometia Henrietta era agressivo, se espalhava rapidamente para outros órgãos e não podia ser tratado com os tratamentos disponíveis na época. Henrietta morreu no dia 4 de outubro de 1951, aos 31 anos
De seu corpo, sem seu consentimento prévio, e por mais de uma vez, foram retiradas amostras de células que viriam a ser cultivadas e multiplicadas em laboratório: as células HeLa.
Conheça o livro e o filme que contam a história de Henrietta Lacks e das células HeLa.
O livro “A vida imortal de Henrietta Lacks” (2010)
Rebecca Skloot, autora do livro, ouviu sobre Henrietta Lacks pela primeira vez durante uma aula de biologia. Seu professor contou, sem muitos detalhes, quem era Henrietta Lacks no contexto das pesquisas com células tumorais.
Rebecca, no entanto, queria entender mais sobre Henrietta, cuja história muitas vezes se resumia a uma nota de rodapé ao final da página de um livro. Foi assim que surgiu a ideia de escrever a obra que homenageia a mulher que ajudou a revolucionar a medicina.
Rebecca passou anos investigando a história de Henrietta e de sua família, percorrendo laboratórios, hospitais, entrevistando pessoas comuns, cientistas renomados, buscando informações em diários, prontuários médicos, documentos, obituários e testamentos.
O resultado é um livro detalhado que conta, não apenas a história de vida de Henrietta, mas também como foi o diagnóstico e o tratamento de sua doença, bem como de que forma as células HeLa impactaram a pesquisa médica.
Rebecca dedica vários capítulos do livro para mostrar o contexto da sociedade e da pesquisa médica na época, e como isso, possivelmente, refletiu na forma indevida pela qual as células de Henrietta foram usadas, sem seu consentimento, para fins de pesquisa em um dos laboratórios do Hospital Johns Hopkins.
O livro também cita médicos e especialistas importantes na história de Henrietta e das células HeLa, como Dr. George Otto Gey e Margaret Gey (especialistas em câncer que cultivaram as células HeLa pela primeira vez); Dr. Howard Jones (ginecologista e pioneiro em medicina reprodutiva, que foi o primeiro a examinar Henrietta) e Dr. Richard Wesley TeLinde (um dos maiores especialistas em câncer de colo de útero da época).
A autora do livro aborda aspectos científicos e éticos no contexto das células HeLa, mas usando uma linguagem didática e de fácil compreensão. Por esses e outros motivos, Rebecca Skloot ganhou inúmeros prêmios, dentre eles o National Academies Communication Award, que premia obras que ajudam na divulgação científica de assuntos ligados à medicina.
Rebecca Skloot é formada em biologia e tem grande experiência com jornalismo científico. A obra que retrata a vida de Henrietta Lacks foi seu primeiro livro e se tornou um grande sucesso de crítica e de vendas. Leia um trecho do livro (em inglês) neste link.
O filme “A vida imortal de Henrietta Lacks” (2017)
Disponível na HBO Max
Baseado no livro de mesmo nome, o filme é um drama que conta a história de Rebecca Skloot (a autora do livro e, agora, personagem interpretada por Rose Byrne) na busca pela família de Henrietta Lacks.
No filme são retratadas as investigações e descobertas feitas por Rebecca, a jornada que ela enfrentou para conseguir a confiança dos familiares de Henrietta e como ela conseguiu os diversos depoimentos, documentos e entrevistas que usou para escrever o livro.
Uma relação bastante destacada no filme, e que reflete o que ocorreu na vida real, é entre Rebecca e Deborah (filha de Henrietta, interpretada por Oprah Winfrey). Deborah tinha apenas 2 anos quando sua mãe morreu e foi uma das principais fontes para Rebecca escrever a história.
O filme e o livro abordam a vida de Henrietta Lacks e as células HeLa a partir de diferentes pontos. Enquanto o livro é mais descritivo e traz mais detalhes científicos e médicos, o filme aborda esses aspectos de forma mais sucinta, e enfatiza de maneira mais emotiva a história de Henrietta e de seus familiares. As duas obras, a partir de diferentes enfoques, se complementam. |
A importância das células HeLa para a medicina
As células HeLa formam a primeira linhagem de células humanas que podem crescer e se multiplicar indefinidamente em laboratório, o que levou os cientistas a usarem os termos “células imortais” para se referenciar a elas. As células HeLa permitiram a realização de testes em tecidos humanos fora do corpo pela primeira vez.
Ao longo dos anos, essas células foram usadas em inúmeros estudos que permitiram grandes inovações na medicina. Alguns exemplos de como as células HeLa foram importantes para a medicina mundial incluem contribuição no desenvolvimento da vacina contra a poliomielite, no entendimento do mecanismo pelo qual o vírus HPV (papilomavírus humano) está relacionado ao câncer de colo de útero e no entendimento de como a telomerase está envolvida com o envelhecimento celular.
Em 2020 as células HeLa foram essenciais para identificar o SARS-CoV-2 como causador da COVID-19 e para o desenvolvimento de vacinas contra a doença.
Ética na pesquisa médicaA história de Henrietta Lacks evidencia sérios problemas éticos na pesquisa médica feita a partir de suas células. Na época, não haviam leis que obrigassem os médicos a pedir autorização para os pacientes doadores de amostras biológicas. No entanto, por anos após sua morte, informações sobre Henrietta foram divulgadas na mídia e suas células foram usadas mundialmente, sem a autorização de sua família. Hoje existem regras claras sobre o consentimento dos pacientes, o uso das células para pesquisa médica e a privacidade dos registros médicos. Esses avanços foram, em grande parte, conseguidos por reflexões que surgiram após o caso de Henrietta Lacks. |
O legado de Henrietta Lacks persiste através de suas células imortais. As células HeLa continuam sendo uma ferramenta essencial para que cientistas de laboratórios de todo o mundo realizem suas pesquisas nas mais diversas áreas da medicina. Tanto o livro quanto o filme abordam vários desses aspectos ao longo de uma narrativa que comove e que homenageia a vida e importância de Henrietta.
Revisão |
Quem foi Henrietta Lacks?
Henrietta Lacks foi uma mulher afro-americana, diagnosticada, em 1950, com câncer de colo de útero, quando tinha pouco mais de 30 anos. Durante as consultas, médicos retiraram, sem ela saber, amostras das células de seu tumor, que depois foram usadas para fins de pesquisa médica. Qual filme conta a história de Henrietta Lacks? O filme “A vida imortal de Henrietta Lacks” (2017) conta a história de vida de Henrietta e de sua família, bem como mostra a importância das suas células para a pesquisa médica. O filme é baseado no livro de mesmo nome, escrito por Rebecca Skloot, publicado em 2010. O que são as células HeLa? As células HeLa formam a primeira linhagem de células humanas que podem crescer e se multiplicar indefinidamente em laboratório, o que levou os cientistas a nomear essa linhagem como células imortais. As células HeLa permitiram a realização de testes em tecidos humanos fora do corpo pela primeira vez. Qual a importância das células HeLa? As células HeLa permitiram avanços em diversos campos da medicina, como, por exemplo, o desenvolvimento da vacina da poliomielite, o estabelecimento das bases do envelhecimento celular, o entendimento de como os vírus podem estar relacionados ao câncer e pesquisas com SARS-CoV-2. |
Referências
- Nature. Henrietta Lacks: science must right a historical wrong. Nature. 2020;585(7823):7-7
- Davies P. Significant Research Advances Enabled by HeLa Cells – Office of Science Policy. Office of Science Policy. Published 2010.
- Butanis B. The Importance of HeLa Cells | Johns Hopkins Medicine. Hopkinsmedicine.org. Published April 11, 2017
- Disis ML (Nora). Movie Review of The Immortal Life of Henrietta Lacks. JAMA. 2017;318(24):2410
- Butanis B. Role of The Johns Hopkins Hospital | Johns Hopkins Medicine. Hopkinsmedicine.org. Published April 11, 2017.
- Stump JL. Henrietta Lacks and The HeLa Cell: Rights of Patients and Responsibilities of Medical Researchers. The History Teacher. 2014;48(1):127-180
- Genzlinger N. Review: “The Immortal Life of Henrietta Lacks,” Condensed. The New York Times.
- “The Immortal Life of Henrietta Lacks:” The Scientific and the Sentimental | Arts | The Harvard Crimson.
- Jackson N. Vessels for Collective Progress: the use of HeLa cells in COVID-19 research. Science in the News. Published September 4, 2020
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