Entenda as novas variantes do SARS-CoV-2

Mutações em vírus acontecem o tempo todo. Às vezes, novas variantes surgem e desaparecem. Outras vezes, novas variantes surgem e persistem. As mutações são uma tentativa do vírus de escapar do sistema imune do hospedeiro. Quanto mais pessoas infectadas, mais variantes aparecem.

Múltiplas variantes do SARS-CoV-2 foram documentadas globalmente durante este um ano de pandemia. Mas o que são variantes e o que elas significam? Por que algumas são mais perigosas que outras?

Mutação, variante, linhagem e cepa – o que significam?

Embora os termos mutação, variante, linhagem e cepa estejam sendo frequentemente usados alternadamente pela mídia, ou até por estudos, quando se referem à epidemiologia do SARS-CoV-2, é importante distingui-los.

Mutação refere-se à mudança na sequência do RNA do vírus. Por exemplo, D614G é uma substituição do ácido aspártico (D) por glicina (G) na posição 614 da proteína Spike (S) (1; Figura 1). 

Variante se refere aos genomas que diferem em sua sequência. Quando um vírus se replica formando novos vírus com varianções na sua sequencia, constitui-se uma nova variante. Este termo é um pouco menos preciso porque 2 variantes podem diferir por 1 ou várias mutações (Quadro 1).

Linhagem é um conjunto de variantes que se originaram de um vírus ancestral comum.

Uma variante é uma cepa quando tem um fenótipo (características observáveis) comprovadamente diferente e possui consequências comportamentais comprovadas, como por exemplo, uma diferença na transmissibilidade, patogenicidade ou na virulência.

Um exemplo prático: mutações na sequência do RNA viral (D614G, por exemplo), alteram estruturas do vírus (proteína S – a espícula viral) originando uma nova cepa (P.1) mais forte, causando uma doença mais grave. Essa cepa pode gerar variantes de si mesma, fomando uma linhagem.

Entenda o Coronavírus – SARS-CoV-2

O SARS-CoV-2, agente etiológico da COVID-19, pertence à família dos Coronavírus, que são um grupo de vírus envelopados que possuem RNA linear de fita simples. O genoma do SARS-CoV-2 tem cerca de 30.000 nucleotídeos e codifica 4 proteínas (Figura 1):

  • Proteína Spike (S)
  • Proteína de Membrana (M)
  • Proteína do Envelope (E)
  • Proteína do Nucleocapsídio (N)
Figura 1: Ilustração representando as estruturas do SARS-CoV-2.

Múltiplas variantes do SARS-CoV-2 foram documentadas globalmente durante esta pandemia (1, 2). Estima-se que ele acumule cerca de 2 mutações por mês, mas a maioria das novas variantes não tem impacto real na pandemia. 

Porém, um pequeno número de mutações pode fornecer novas características para o vírus que alteram a forma como ele se propaga entre nós, como nosso organismo reage e como pode responder à infecção.

Por isso, desde o início da pandemia existem programas de vigilância genômica com compartilhamento de dados e plataformas colaborativas online que permitem o rastreamento em tempo real da emergência e disseminação dessas novas cepas. (1)

Um exemplo foi a mutação D614G. No início da pandemia, a maioria dos vírus tinha um ácido aspártico (representado pela letra D) na posição 614, contudo, desde março de 2020 têm se observado o aminoácido glicina (G) nessa posição. Essa nova variante se espalhou rapidamente pela Europa e América do Norte e demonstrou ter maior capacidade de promover infecção (1).

As novas variantes do SARS-CoV-2

No Brasil, o início da epidemia de SARS-CoV-2 foi dominada por duas variantes: B.1.1.28 e B.1.1.33, que também estavam prevalentes na maioria dos outros países (2, 3, 4). 

No final de 2020, duas novas “variantes de preocupação” (VOC, entenda melhor esse termo abaixo) do SARS-CoV-2 foram descobertas: 

  • Cepa B.1.351 (Beta), relatada pela primeira vez na África do Sul;
  • Cepa B.1.1.7 (Alfa), detectada no Reino Unido (2, 3). 

Ambas as variantes foram transmitidas rapidamente e se espalharam para outras regiões. As análises indicam que B.1.1.7, a variante alfa, tem maior transmissibilidade e causa quadros mais graves em comparação com linhagens que circulavam anteriormente no Reino Unido (2).

Em janeiro de 2021, pesquisadores brasileiros identificaram subgrupos da B.1.1.28, com mutações comuns àquelas detectadas no Reino Unido e na África do Sul: as variantes foram chamadas de P.1 (Gama) e P.2 (Zeta). O subgrupo P.1 foi detectado pela primeira vez em viajantes japoneses retornando do estado do Amazonas. O subgrupo P.2 foi detectado pela primeira vez no Rio de Janeiro. 

Ambas possuem mutações de grande importância na proteína S (no domínio de ligação ao receptor da proteína S), a região do vírus que viabiliza a entrada do vírus nas células humanas, entre elas, as mutações K417T, E484K e N501Y (Quadro 1)

Estudos sugerem que a mutação N501Y pode tornar o SARS-CoV-2 mais contagioso (5) e a mutação E484K parece reduzir a ação de anticorpos de quem teve a doença anteriormente, aumentando a chance de reinfecção e, possivelmente, reduzindo a eficácia de vacinas (Quadro 1) (5, 6).

O surgimento da variante P.1, a variante Gama, foi responsável pela segunda onda de infecções em Manaus no final de 2020 e início de 2021, que causou um colapso no sistema público de saúde no estado do Amazonas (3).

Em maio de 2021, uma nova variante foi declarada como ‘variante de preocupação’: a variante B.1.617.2, mas conhecida como variante Delta. Encontrada primeiramente na India em dezembro de 2020, a variante Delta têm se mostrado mais transmissível. Até o momento já foi detectada em outros 90 países, incluindo o Brasil, e foi responsável por gerar uma segunda onda mortal de infecções na Índia e se tornou a variante dominante no Reino Unido. A Delta é considerada “double mutant” (duplo mutante) pois apresenta duas mutações da proteína S: E484Q (similar a E484K) e a L452R, também presente na VOC B.1.429.

Conheça as atuais variantes de preocupação

lista das variantes do covid atualizadas, alfa, beta, gama, delta

Classificação das variantes

Alguns órgãos do governo americano, incluindo o NIH (National Institutes of Health) e o FDA (US Food and Drug Administration), se uniram para monitorar e caracterizar ativamente as novas variantes, na tentativa de calcular o impacto potencial delas nas medidas de controle da pandemia, como nas vacinas e nos exames de diagnóstico.

Foi estabelecido um esquema de classificação para as variantes do SARS-CoV-2 que incluem definições e atributos que podem ser alterados conforme novas informações surjam. 

OBS: A Organização Mundial da Saúde (OMS) e os sistemas de saúde de outros países também possuem classificações para o vírus que podem diferir da classificação dos EUA, pois a importância das variantes pode variar de acordo com a localização.

  • Variante de interesse (Variant of Interest, VOI)

Refere-se àquelas variantes que possuem marcadores genéticos que podem afetar a transmissibilidade do vírus, o seu diagnóstico, tratamentos ou que podem fazer o vírus escapar do sistema imunológico (escapam dos anticorpos gerados contra infecção ou vacinação anterior, além de apresentarem evidências que demonstrem ser a causa de um aumento na proporção de casos ou grupos únicos de surtos.

B.1.526 ou Iota (New York/EUA), B.1.525 ou Eta (New York/EUA) P.2 ou Zeta (Brasil), B.1.427 ou Epsilon (Califória/EUA), B.1.429 ou Epsilon (Califória/EUA), B.1.617.1 ou Kappa (Índia), B.1.617.1 (Índia).

  • Variante de preocupação (Variant of Concern, VOC)

Refere-se àquelas variantes que possuem evidências de aumento da transmissibilidade, doença mais grave (aumento de hospitalizações e/ou óbitos), redução significativa da neutralização por anticorpos gerados por infecção anterior ou vacinação, eficácia reduzida de tratamentos ou vacinas, ou falhas na detecção de diagnóstico.

→ B.1.1.7 ou Alfa (Reino Unido), P.1 ou Gama (Japão e Brasil), B.1.351 ou Beta (África do Sul),  B.1.617.2 ou Delta (Índia).

Possíveis atributos de uma variante de preocupação:

  • Atributos de uma variante de interesse (VOI)
  • Evidência de impacto em diagnósticos, tratamentos e vacinas
  • Interferência generalizada com alvos de teste de diagnóstico
  • Evidência de resistência substancialmente aumentada a uma ou mais classes de terapias
  • Evidência de redução significativa da neutralização por anticorpos gerados porinfecção anterior ou vacinação
  • Evidência de redução da proteção induzida pela vacina contra doenças graves
  • Evidência de maior transmissibilidade
  • Evidência de aumento da gravidade da doença
  • Variante de alta consequência (Variant of High Consequence)

Uma variante de consequência alta apresenta evidências claras de que reduz significativamente a eficácia das medidas de prevenção e controle, como testes de diagnóstico e vacinas.

Atualmente não há variantes do SARS-CoV-2 que aumentem para o nível de consequência alta.

O exame de diagnóstico molecular de COVID-19 da Mendelics

Teste de RT-LAMP #PARECOVID

Os exames que detectam o material genético do vírus são a principal ferramenta para diagnóstico de infecções.

Em parceria com o Hospital Sírio-Libanês, a Mendelics desenvolveu um teste chamado #PARECOVID, feito em amostras de saliva, que amplifica (copia) o material genético do vírus pela técnica de RT-LAMP.

O teste utiliza no seu procedimento alvos (primers) do genoma viral localizados da proteína N, em regiões diferentes das regiões mutadas nas cepas do Reino Unido, África do Sul e nas linhagens brasileiras P.1 e P.2.

Portanto, o teste #PARECOVID é capaz de identificar com igual precisão as novas linhagens de importância clínica recentemente relatadas.


Referências

  1. Lauring AS, Hodcroft EB. Genetic Variants of SARS-CoV-2—What Do They Mean? JAMA. 2021;325(6):529–531. doi:10.1001/jama.2020.27124
  2. The United States Centers for Disease Control and Prevention
  3. Faria NR, Mellan TA, Whittaker C, et al. Genomics and epidemiology of the P.1 SARS-CoV-2 lineage in Manaus, Brazil [published online ahead of print, 2021 Apr 14]. Science. 2021;eabh2644. doi:10.1126/science.abh2644
  4. A potential SARS-CoV-2 variant of interest (VOI) harboring mutation E484K in the Spike protein was identified within lineage B.1.1.33 circulating in Brazil
  5. The N501Y spike substitution enhances SARS-CoV-2 transmission. Yang LiuJianying LiuKenneth S. Plante, et al.
  6. Jangra S, Ye C, Rathnasinghe R, et al. SARS-CoV-2 spike E484K mutation reduces antibody neutralisation [published online ahead of print, 2021 Apr 7]. Lancet Microbe. 2021;10.1016/S2666-5247(21)00068-9. doi:10.1016/S2666-5247(21)00068-9

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