Carga viral na saliva e COVID-19

De acordo com novos estudos, testes de SARS-CoV-2 na saliva são mais sensíveis e baratos dos que os testes em amostras de nasofaringe e, além disso, também podem indicar como a doença de um paciente com coronavírus irá se desenvolver.

 

Teste para COVID-19

Desde o início da pandemia do SARS-CoV-2, estudos científicos demonstraram que a testar continuamente a população era a melhor forma de garantir o retorno seguro das atividades. A testagem em massa identifica assintomáticos e pré-sintomáticos e é a melhor estratégia para reduzir a transmissão da COVID-19 e impedir novos surtos.

A maioria dos testes diagnósticos de COVID-19, como o RT-PCR, são feitos a partir da coleta de swab nasofaríngeo, no qual um cotonete é introduzido na garganta ou no nariz do paciente. Esse tipo de coleta causa desconforto nos pacientes e aumenta o risco de contaminação dos profissionais de saúde.

No início de 2020 houve uma enorme demanda mundial de testagem, o que causou a escassez do kit de coleta de swab em todo o mercado. A falta de insumos para os testes de RT-PCR por swab nasofaríngeo também contribuiu para a limitação da capacidade de testagem no Brasil.

Concomitantemente, se tornou crescente o desenvolvimento de testes de detecção do SARS-CoV-2 pela saliva. A Mendelics desenvolveu, em maio de 2020, o primeiro teste em amostra de saliva do Brasil, o #PARECOVID

O teste na saliva é sensível e custa menos

A escolha da saliva foi embasada por artigos que demonstraram que a saliva é tão eficaz e sensível quanto amostras nasofaríngeas para identificar o SARS-CoV-2. 

Muitos estudos já apontaram os benefícios do teste na saliva. Recentemente, em janeiro de 2021, uma revisão sistemática e meta-análise realizada por pesquisadores da universidade de McGill, no Canadá, concluiu que testes com saliva são tão eficazes quanto com swab nasal. O grupo incluiu na pesquisa 37 estudos que incluíam ≥5 amostras pareadas de swab nasofaríngeo e saliva (1). 

Além disso, os pesquisadores analisaram os custos associados aos dois tipos de coleta (swabs, meios de transporte, recipientes e equipamentos de proteção individual). O resultado demonstrou que, além do teste na saliva ser mais sensível, também custa menos do que o teste que utiliza swab nasofaríngeo (1).

 

A saliva pode indicar gravidade da COVID-19

Desde o início da pandemia de COVID-19, um dos maiores desafios para médicos, cientistas e especialistas da área é compreender a grande variabilidade de sintomas associados à infecção por SARS-CoV-2, e identificar uma correlação clínica que explique os casos graves e a mortalidade.

Nesse ínterim, variantes genéticas em genes do sistema de grupos sanguíneos ABO e em genes associados à resposta imune inata e aos processos inflamatórios foram associadas aos casos mais graves de COVID-19. 

Outros estudos analisaram a carga viral em amostras corporais, como: nasofaringe, expectoração, saliva, plasma, urina e fezes de modo a identificar uma correlação com o desfecho clínico em cada caso. Alguns desses estudos, observaram associação entre a carga viral nasofaríngea e aspectos específicos da COVID-19. 

Na tentativa de identificar um fator clínico capaz de distinguir casos leves e graves da COVID-19, cientistas da Universidade de Yale e colaboradores buscaram possíveis associações entre a carga viral na saliva e parâmetros importantes da doença (4).

Na pesquisa científica descrita no artigo publicado na medRxiv em janeiro “Saliva viral load is a dynamic unifying correlate of COVID-19 severity and mortality”, os pesquisadores analisaram a carga viral de amostras de saliva e da nasofaringe ao longo do tempo e as correlacionaram com dados demográficos do paciente e com alguns aspectos biológicos (2). 

 

A carga viral na saliva é uma importante medida clínica

Foram incluídos no estudo, 172 pessoas com COVID-19 classificadas conforme gravidade dos sintomas, incluindo um grupo de pessoas não-hospitalizadas (109), com a doença moderada  (81), grave (42) e fatal (23 pessoas morreram durante o estudo). Como grupo controle foram incluídos 108 profissionais da saúde não infectados.

Os resultados do estudo demonstraram que a carga viral da nasofaringe não é equivalente à saliva em processos de doença na COVID-19 e que a carga viral medida pela saliva está associada a forma de apresentação da COVID-19, sua gravidade e sua mortalidade ao longo do tempo.

Os cientistas observaram que a carga viral da saliva estava significativamente maior em pacientes com fatores de risco para COVID-19, como hipertensão e doença pulmonar crônica, e que se correlacionava com níveis crescentes de gravidade da doença demonstrando ser um bom preditor de morbidade ao longo do tempo.

Ao analisar aspectos biológicos mais específicos, como fatores imunológicos e celulares, os cientistas observaram preditores de alta e baixa carga viral na saliva, que estão associados com aumento da gravidade da doença ou com melhores desfechos. 

Esses preditores são, por exemplo, marcadores de inflamação já bem conhecidos, como as interleucinas (IL-6, IL-18, IL-10 e CXCL10). No estudo, essas interleucinas se mostraram positivamente associadas a carga viral na saliva. Isto é, quanto mais vírus na saliva, mais inflamação. 

Outros preditores observados foram as plaquetas, linfócitos e alguns subconjuntos de células T, que diminuem progressivamente à medida que a carga viral aumenta, demonstrando um papel fundamental na resposta humoral contra a replicação do vírus.

O artigo também descreveu uma correlação negativa entre carga viral e anticorpos IgG. Pacientes com COVID-19 fatal exibiram cargas virais mais elevadas, que se correlacionaram com a diminuição da quantidade de um subgrupo de células T e produção mais baixa de níveis de alguns tipos de anticorpos IgG (anti-proteína Spike (S) e anti-domínio de ligação ao receptor (RBD)).

De modo geral, o artigo revela um importante papel da carga viral da saliva como uma medida clínica de gravidade da doença e mortalidade da COVID-19 e, também, ressalta a importância do monitoramento da carga viral desde o início dos sintomas da COVID-19.

Saiba porque é importante continuar se testando mesmo depois de se vacinar para a CVID-19.

 


Referências

  1.  Bastos ML, Perlman-Arrow S, Menzies D, Campbell JR. The Sensitivity and Costs of Testing for SARS-CoV-2 Infection With Saliva Versus Nasopharyngeal Swabs : A Systematic Review and Meta-analysis. Ann Intern Med. 2021 Jan 12. doi: 10.7326/M20-6569. Epub ahead of print. PMID: 33428446.
  2. Silva J, Lucas C, Sundaram M, Israelow B, Wong P, Klein J, Tokuyama M, Lu P, Venkataraman A, Liu F, Mao T, Oh JE, Park A, Casanovas-Massana A, Vogels CBF, Muenker CM, Zell J, Fournier JB, Campbell M, Chiorazzi M, Ruiz Fuentes E, Petrone M, Kalinich CC, Ott IM, Watkins A, Moore AJ, Nakahata MI, Grubaugh ND, Farhadian S, Dela Cruz C, Ko A, Schulz WL, Ring AM, Ma S, Omer S, Wyllie AL, Iwasaki A. Saliva viral load is a dynamic unifying correlate of COVID-19 severity and mortality. medRxiv [Preprint]. 2021 Jan 10:2021.01.04.21249236. doi: 10.1101/2021.01.04.21249236. PMID: 33442706; PMCID: PMC7805468.

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